segunda-feira, 25 de dezembro de 2017

O que é Aculturação? Como pesquisar e entender o choque entre culturas.

Créditos: Imagem extraída do google imagens




Entendendo o termo Aculturação dentro da abordagem de Nathan Wachtel


A "Aculturação" se tornou um termo muito utilizado na antropologia e na sociologia, mas também muito recorrente em história, principalmente quando se trata do período colonial, onde temos geralmente uma cultura subjugada por uma cultura dominante. No entanto, seria muito simplista dizer que a aculturação diz respeito apenas a esta forma de dominação. Falar de aculturação em história chega a ser quase uma intervenção filosófica, tamanha a complexidade léxica desse conceito. O termo aculturação tem a função de conceituar o processo resultante do contato entre duas ou mais culturas. No entanto, esse processo nunca segue uma regra geral, ou seja, não há um conceito de aculturação que se encerra em si mesmo. 



Natan Wchtel - imagem divulgação

Os primeiros estudos de aculturação tinham em voga o período colonial e havia uma conotação evolutiva nesse termo, ou seja, esboçava a ideia de uma supremacia da cultura européia. Sendo que o adjetivo “aculturado” significava claramente “evoluído” evocando a ideia de que o processo de aculturação correspondia a um progresso da sociedade dirigindo-se a um modelo ocidental. Essa noção de aculturação está evidentemente superada. Como observa Nathan Wachtel:

Com efeito, a aculturação não se reduz a uma única marcha, à simples passagem da cultura indígena à cultura ocidental; existe um processo inverso, pelo qual a cultura indígena integra os elementos europeus sem perder suas características originais. Essa dupla polaridade confirma que a aculturação não pode ser reduzida à difusão, no espaço e no tempo, de traços culturais arbitrariamente isolados: trata-se de um fenômeno global que compromete toda a sociedade.  (WACHTEL, 1976 ,p 114)
            Ainda que a noção - nos dizeres de Nathan Wachtel  -  “conserve de sua origem colonial duas características complementares: uma interna, a heterogeneidade das culturas em presença, outra externa, a dominação de uma pela outra.”(WACHTEL 1976, p. 114). Wachtel ainda sugere que essas duas noções devem ser consideradas e deve ser aplicada na pesquisa sobre aculturação para depois termos elementos nos quais possamos fazer alguma generalização, no entanto, o próprio autor desmistifica tal abordagem dizendo que:

Mesmo se limitarmos a aculturação ao campo restrito da situação colonial, a extrema complexidade de processos e resultados parece, contudo, desafiar toda tentativa de generalização: nada mais arbitrário que isolar uma seqüência ou uma evolução que é declarada válida para todos os casos. Tantos quanto forem os exemplos concretos, tantas serão as aculturações diferentes.  (WACHTEL, 1976, p. 114)


            Sendo assim para cada abordagem sobre aculturação, um método deve ser utilizado caso não haja nenhum modelo na literatura, deve-se realmente criar uma metodologia. Wachtel estudou a fundo a dominação espanhola na América e para ele a aculturação pode ser imposta, ou espontânea. A primeira é quando a dominação estrangeira se dá de forma completa, no campo político, econômico e religioso, esse sistema é baseado na violência. A cultura dominante se impõe em detrimento da cultura dominada. Já a aculturação espontânea ocorre através de contatos comercias e pacíficos.
Ainda considerando os diversos fenômenos de aculturação, podemos distinguir uma outra divisão no seu processo. Trata-se – ainda usando Wachtel – da “integração” e no pólo oposto a “assimilação”: “No processo de integração os modos de uma cultura estrangeira são incorporados pela cultura dominada, que por sua vez modela esses elementos de acordos com seus próprios meios de vida. Wachtel nos dá um exemplo ao abordar a dominação espanhola da America:

Os elementos estranhos são incorporados ao sistema indígena que os submete a seus próprios esquemas e categorias; e mesmo se provocam mudanças no conjunto da sociedade, essa reorganização adquire sentido no interior dos modelos e valores autóctones ... Os navajos representam o caso clássico de uma sociedade constantemente enriquecida por contribuições exteriores, livremente selecionadas; originalmente caçadores –coletores e seminômades, receberam de seu contato com os pueblos determinados elementos de agricultura que favoreceram uma relativa estabilização de seu habitat (exemplo original de aculturação entre sociedades indígenas, mas de tipos diferentes).   ( WACHTEL, 1976, p. 118)


            Já no processo de assimilação ocorre o inverso, os elementos da cultura dominante substituem os elementos tradicionais dos seus dominados, por exemplo:

A adoção de elementos europeus se acompanha da eliminação das tradições indígenas, submetendo-se aos modelos e aos valores da sociedade dominante; ao final dessa evolução, a identidade étnica se dissolve nas variantes da cultura ocidental. (WACHTEL, 1976, p. 118)


Mas, o complexo de elementos contidos no tema, aculturação não param por aí. Entre assimilação e integração podem ser identificados outros tipos intermediários de aculturação. “É o caso de diversos sincretismos, combinações de elementos saídos de culturas diferentes, mas que dão lugar a um novo sistema ordenado segundo princípios distintos daqueles que regiam os sistemas de origem. No entanto não podemos pensar que esses diversos elementos de aculturação: integração, assimilação, sincretismo, disjunção, etc, são processos únicos de uma determinada sociedade, muitas vezes são processos que se alternam dentro de uma mesma sociedade. A estabilidade cultural dentro de uma sociedade que sofreu algum tipo de aculturação não segue, entretanto, uma lei linear que vai da integração á assimilação passando necessariamente por suas intermediárias, tudo depende de suas raízes intrínsecas, ou seja, cada sociedade ou sistema cultural definirá o que introduzir, assimilar ou rejeitar.
             Temos condições nesse momento de definir alguns pontos conclusivos para o uso do conceito de aculturação em uma pesquisa sobre história. Primeiro, comparar os elementos pertinentes ao objetivo da pesquisa, com a noção de colonialismo nos termos de Nathan Wachtel – cultura dominante, cultura dominada. Segundo, identificar através da bibliografia especializada - mesmo que seja na área de sociologia - o processo pelo qual a aculturação se dá - de forma espontânea, ou imposta. Terceiro, como é concretizada a aculturação, ou seja, como é feita a assimilação ou integração de novos elementos culturais na sociedade pesquisada, como são abandonados os elementos tradicionais dessa sociedade -  para essa etapa da pesquisa acho importante a utilização de fontes orais, já que são os membros dessa sociedade que participaram e participam do processo descrito. Quarto, já que se trata de uma aculturação contemporânea, onde quem vive esse processo é minha própria geração, é necessário inserir esses elementos dentro da ótica da modernidade, onde não será possível fugir á termos como, globalização, modernização, multiculturalismo dentre outros.     

Fontes:

  • Natan Wachtel - História e Antropologia de uma America "subterrânea". Disponível em: PDF  http://www.scielo.br/pdf/sant/v4n1/2238-3875-sant-04-01-0259.pdf. Acesso em 25 de dezembro de 2017. 
  • WACHTEL, Nathan. A aculturação. In: História: novos problemas. Direção de Jacques Le Goff e Pierre Nora, tradução de Theo Santiago. Rio de Janeiro: F. Alves, 1976.  


André Stanley é escritor e professor de História, Inglês e Espanhol, autor do livro "O Cadáver", editor dos blogs: (Blog do André Stanley, Stanley Personal Teacher). Colaborador do site especializado em Heavy Metal Whiplash. Foi um dos membros fundadores da banda de Heavy Metal mineira Seven Keys. Também é fotógrafo e artista digital. 



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