Muitos me perguntam “Por que você escolheu
a história? O engraçado é que sempre fico pasmo quando isso ocorre,
porque talvez não se tem a medida correta da utilidade da História para a
humanidade. Desde Marc Bloch vem se tentando de
diversas formas definir a relevância da história. Pois confesso que a aptidão
de muitos de meus colegas para história passa pelo crivo da curiosidade. Muitos
até são atraídos pela imaginação fértil de alguns escritores de romances
históricos que desviam liricamente os rumos dos acontecimentos para criar um
romance usando vultos históricos que tiveram certa relevância.
O fato é que fosse essa curiosidade o único
elemento atrativo da história – afinal a curiosidade é que levou o homem a
grandes feitos – seria uma razão sublime, principalmente no campo da
literatura. Mas podemos identificar um fator mais potente no estudo da história
do homem e sua ação no mundo. As grandes religiões por exemplo - óbvio que é um
lugar comum sempre trabalhar com as três grandes religiões, apenas por uma
questão didática, mas isso se aplicaria a todas a religiões - são fundamentadas
sobre bases históricas que a legitimam entre seus praticantes. Essa utilização
da história como fundação e legitimação de uma crença é um exemplo de como ela
– a história – é poderosa.
Por que os religiosos são tão bem sucedidos na
utilização da história? – a própria história nos mostra o quanto essas
instituições são poderosas mesmo hoje em dia. Uma das possíveis respostas e
justamente a falta de conhecimento histórico da sociedade. Isso não é
exclusividade de nossos tempos, pois desde a antiguidade já se destacavam
alguns vultos sociais que ao se utilizar de uma história fundadora puderam
criar um embrião que por vezes se tornou um credo em comum em toda a sociedade
– falo dos grandes profetas que mesmo não tendo a intenção de criar uma
religião foram responsáveis pelo surgimento delas.
Mas a maior causa do surgimento de ideais
espiritualistas no meio das sociedades não vem de cima, é a própria
incapacidade das pessoas de questionar suas praticas e modos de vida que as
tornam suscetíveis a serem guiadas por mentes muitas vezes doentias demais para
notarem sua interferência na vida social de suas comunidades.
Meu interesse pelo conhecimento histórico surge
justamente da capacidade que adquiri de questionar a legitimidade de livros
sagrados e da história oficial das nações. O selo do sagrado e do oficial são
formas de engessar a história. Há de se notar que se a história for sempre
vista como uma corrente de fatos retos e inquestionáveis, sempre haverá um
tirano ascendendo ao poder e religiosos cometendo atrocidades que desafiam a
compreensão. A passividade do homem é uma doença perigosa e fatal não somente
por fazer do homem uma ovelha amestrada, mas principalmente por cegá-los a
ponto de considerarem aqueles que conseguem se livrar das garras estreitas de
seus pastores – analogia mais que pertinente – como insanos.
Quem escolhe ser historiador simplesmente por
curiosidade já pode ser considerado um questionador, mas isso somente ainda não
faz dele verdadeiramente um historiador. O que conduz alguém a se embrenhar
pelo território mágico da história é, sobretudo seu espírito contestador.
Questionar as ações do homem é tarefa fundamental de cada historiador que se
preze.
Há uma razão histórica para sermos o que somos, e
vivermos no mundo em que vivemos. Somos herdeiros de um processo histórico que
jamais acaba. Mas o que devemos ter em mente é o fato de sermos os atores no
palco da história. O homem é aquele que age e cria. Não haveria história se não
houvesse o homem. O que parece uma redundância as vezes é o que tem de ser
dito, pois notamos atualmente uma atrofia do homem em relação a sua história.
Um homem apático demais para almejar fazer história.
Escolhi estudar história por não estar satisfeito
com as explicações oficiais. Por não concordar com a tirania de alguns. E
principalmente para notar, olhando do lado de fora dos acontecimentos o que
realmente ocorreu e como agir mediante esses acontecimentos.
A história que foi por muito tempo pejorativamente
tachada de uma simples arte, em detrimento de considera-la ciência, pode ser
sim considerada uma arte sem nenhum constrangimento. A História
nada mais é do que a arte de questionar e contestar o que está escrito. É a
arte da não aceitação do que lhe é imposto como verdade. Pensem nisso.
André Stanley é escritor e professor de História, Inglês e Espanhol,
autor do livro "O Cadáver", editor dos blogs: (Blog do André Stanley,
Stanley Personal Teacher). Colaborador do site especializado em Heavy Metal
Whiplash. Foi um dos membros fundadores da banda de Heavy Metal mineira Seven
Keys. Também é fotógrafo é artista digital.
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